Setembro amarelo: Hoje eu chorei. Chorei como não chorava há alguns meses

Jo Melo
3 min readSep 10, 2024

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Hoje eu chorei. Chorei como não chorava há alguns meses. Achei que estava aguentando bem, mas não. Só estava sendo mais uma dentre tantas mulheres que precisam sobreviver e carregar, sozinha, o peso social de sua existência, como mulher e como mãe. A verdade é que 2024 tem sido um ano muito difícil para mim. Desde o começo, tudo começou mal. Na verdade, antes, na virada do ano, com uma crise de meltdown por conta de muito barulho e ansiedade.

Depois, sem mais nem menos, fui mandada embora do trabalho, justamente pouco tempo após ter apresentado meu laudo. Como sou PJ, saí com uma mão na frente e outra atrás.

Fiquei sem UM TOSTÃO no bolso e com um filho para criar. Minhas economias duraram uns dois meses, depois disso, a pindaíba chegou, e com ela, uma maré intensa de azar. As coisas começaram a ficar péssimas. Tive de fazer rifa para COMER, veja bem. Nenhum emprego até então, várias entrevistas e nada.

Cinco meses se passaram e, quando achei que não poderia piorar, piorou: TROPECEI E QUEBREI O BRAÇO. Mas não foi algo simples, como usar gesso e pronto. Precisei fazer cirurgia. Meu osso quebrou de um jeito complicado. E, antes da cirurgia, passei dez dias só com uma tala, o braço quebrado, esperando a operação. Eu respirava e tudo doía. Não conseguia comer sozinha, tomar banho sozinha, usar o banheiro sozinha. Após dez dias de tortura e dores tão intensas que cheguei a querer me machucar para parar a dor, fiz a cirurgia. Uma placa e treze parafusos passaram a fazer parte da minha vida desde então, junto com as dores pós-operatórias. O médico me deu no mínimo seis meses para voltar ao normal.

Ainda estou no quarto mês e, nesse tempo, continuo sem emprego, sem trabalho, tendo que pedir ajuda e empréstimos. Meu nome? Nem limpo está mais. Estou devendo uma quantia que muita gente ganha por mês. Recebi ajuda, sim, de pessoas, mas uma hora enche o saco, né? Eu sei. Caridade tem validade. E não culpo ninguém por isso.

Consegui acesso ao INSS, mas quem vive com R$ 1.400? Tenho água, luz, gás, apartamento, internet, condomínio, compras do mês… E ainda falta. Preciso pular uma conta para pagar outra. Tanto que cortaram minha luz esses dias. Agradeço a quem me ajudou. Mas de que adianta toda minha competência se eu não sou branca e privilegiada? Queria eu ter nascido com lábia e menos melanina, e com a cabeça “normal”. É a verdade.

Fora isso, tem a maternidade solo, o filho e a escola, que estão péssimos. Estou tendo que lidar com a adolescência, minha casa (afinal, preciso limpar a casa, fazer comida, lavar roupa, etc., porque não tenho dinheiro para pagar alguém para fazer por mim). Não tenho papai e mamãe para lavar minhas calcinhas, mas invejo quem tem.

Diante de tantas coisas, para ajudar, minha geladeira pifou. Eu chorei. Antes, durante a terapia, e depois também. Estou um caco. Cansada, desgostosa e triste. Tenho pessoas que me apoiam, mas, nas 20 horas ou mais do meu dia, sou eu por mim mesma. E é cansativo demais.

A única coisa que consegui foi descarregar esse peso em forma de palavras e lágrimas: salgadas e tristes, cansadas e com o desejo de ser carregada e cuidada. Ter o cuidado que nunca tive na vida. Desde que nasci. É pedir muito conseguir viver bem?

Na rede social é tudo lindo e chega uma hora que a máscara cai de tanto que o rosto ta inchado de chorar. Pedir ajuda é como mendigar o mínimo e ser ignorada. A vida segue.

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Jo Melo

Mãe, autista/tdah com hiperfoco em escrita e premiada na Suíça. Escrevo sobre autismo, mulheres, maternidade. @jomelo.escritora. Aqui tem textos desde 2016.